terça-feira, 18 de março de 2014

XIII - DE LUANDA A SERPA PINTO

-FARDA OU FARDO?-
Aterro em Luanda e tenho a aguardar-me, no Aeroporto, o meu amigo Francisco Fontes, irmão do já citado Noé - que comigo tirou uma fotografia em casa dos meus pais -, e que igualmente viria a ser meu colega no mesmo Banco, terminando a sua carreira como Gerente do Balcão da Venda Nova. Transmito-lhe que está tudo bem com a sua família, entrego-lhe um pequeno pacote de que fui portador e relato a situação do meu pai. Ele estava por dentro de tudo mas nunca me havia revelado absolutamente nada. Dirigimo-nos para o domicílio de seu Tio António, na Avenida Brasil, próximo da Vila Alice – homem generoso e muito prestimoso, a quem muito fiquei a dever na vida, recentemente falecido em Celorico de Basto. Não soube atempadamente da sua morte razão por que não estive presente no seu funeral, o que muito lastimo -, casa onde eu estive aboletado durante os 3 meses enquanto a minha Companhia esteve de Serviço à Rede logo após o desembarque em 21 de maio do ano anterior. Os Graduados estavam autorizados a pernoitar fora do Quartel do Grafanil, havendo uma viatura que fazia a recolha domiciliária diariamente logo pela manhã cedo.

Fardo-me e dirijo-me imediatamente ao QG (Quartel-General) para me apresentar na Região Militar de Angola, a fim de carimbar o Passaporte Militar e, dessa forma, regularizar a minha situação de retorno à RMA. Fui dispensado de me apresentar nos Adidos uma vez que a viagem para Serpa Pinto teria lugar daí a dois dias, tempo aproveitado para gozar Luanda e os seus encantos.
O AUTOR E O XICO FONTES NA MARGINAL
NA ILHA DO MUSSULO














Trajando à civil, tomo um Friendship (avião turbo-hélice) da DTA para Serpa Pinto, via Nova Lisboa. Para minha surpresa, vejo na Pista de Aterragem, à chegada àquela longínqua cidade, o Major Ló, também trajando à civil. E para meu espanto, depois de cumprimentos feitos por ele a algumas pessoas que comigo viajaram, dirige-se a mim, pôs a mão no meu ombro e diz-me: “então Mota, como correram as férias?”. Fiquei admirado por ele ter conhecimento que eu viajava ali e ser sabedor do meu nome, não pertencendo eu ao seu Batalhão… A minha Companhia encontrava-se em reforço da sua Unidade mas não lhe era organicamente afeta. Dei-lhe uma resposta de circunstância e procurei ser afável. “Disparou” de imediato: “É preciso ir rapidamente para baixo pois há por lá uns problemas que eu quero ver resolvidos com urgência!”. Deduzi ao que se reportava, pois, antes da minha saída, tinham sido detetadas situações anómalas quanto a abastecimentos em alguns nossos Destacamentos. Com um ar respeitoso, disse-lhe eu: “vou já tratar à CCS do transporte no Cessna, pois quanto mais depressa lá chegar mais depressa mato o leão!”. Olhou para mim com um ar circunspecto, num misto de surpresa pelo atrevimento e algo que não estivesse a entender, tentando adivinhar o sentido dúbio das minhas palavras, e, inteligente como era (é, ele ainda é vivo), o seu semblante sofreu uma metamorfose rapidíssima: passou do olhar gélido, tipo “fuzilamento”, para o do sorriso, dizendo, com alguma simpatia: “a notícia do Luengue chegou rápida, já estou a ver!”. É que o Carlos Paulo, da Companhia de Cavalaria 2499, tinha abatido um leão no Destacamento do Luengue, o que era absolutamente proibido. Foi-lhe feita uma ameaça duma punição muito severa, mas, felizmente, nada aconteceu. Desconheço o destino que foi dado ao cadáver do bicho, desde a juba até aos ossos …

Feitas as necessárias e habituais diligências na Secretaria da Companhia de Comando e Serviços do Batalhão de Cavalaria 2870, eis-me pronto para embarque, no dia aprazado,  fardado de camuflado, no Cessna dos “nossos primos”, de regresso à minha “família militar”.


Carlos Jorge Mota

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